segunda-feira, 24 de outubro de 2011

Por que sonhamos?

            O Psicanalista J. Miller (1998) afirma que dormimos para encontrar os nossos sonhos. Dessa forma, sonhar não é apenas mais um fenômeno da mente humana, mas uma expressão simbólica para falarmos de nós mesmos.
            Mas o que significa efetivamente o ato de sonhar? Qual a sua utilidade na vida diária? Será que todas as pessoas sonham? Podemos acreditar nas interpretações populares sobre o significado dos símbolos oníricos?
            É impossível falar dos sonhos e não referenciar o pai da Psicanálise Sigmund Freud. Em sua obra “A interpretação dos sonhos” (1933) teoriza a relação do sonho e o inconsciente. Segundo Freud o sonho é uma expressão simbólica de conteúdos reprimidos e ou censuráveis de desejo ou de angústia derivados do inconsciente. O sonho nesse contexto revela componentes emocionais reprimidos e que são condensados ou modificados quando deslocados à consciência.
  Vamos simplificar para facilitar o entendimento. Quando sonhamos estamos abrindo a porta da nossa censura (processo que barra conteúdos inconscientes para o consciente), que durante o dia permanece trancada, possibilitando o acesso à consciência. Tais conteúdos passam a ter uma linguagem própria e podem ser dignos de interpretações à medida que lembramos ou falamos a respeito do que sonhamos.
            O conteúdo do sonho pode variar de pessoa para pessoa, porém, sempre haverá um significado para cada sonho manifesto. Isso não significa que necessariamente o fato da pessoa ter sonhado com um animal, por exemplo, uma cobra, deva significar traição ou erotismo. Cada pessoa terá um sentido próprio para esse animal, logo, traduzir o sonho de uma forma generalista é cometer um erro grosseiro. As interpretações de sentido global e de entendimento popular são apenas uma expressão folclórica do inconsciente coletivo de uma determinada cultura.
Há duas razões básicas para explicar a existência do sonho: a primeira refere-se ao sonho como uma estrada verdadeira para encontrarmos com o que há de mais guardado ou “escondido” em nosso campo mental. Muitos dos nossos conflitos emocionais ou Psicoafetivos são reprimidos pelo processo inconsciente levando à formação de sintomas Psicopatogênicos, ou seja, várias Psicopatologias do cotidiano como o Transtorno da Ansiedade, Síndrome do Pânico, Transtorno Depressivo, fobias sociais e outros podem, e na maioria das vezes, são de origem psicológica e estão enraizados na estrutura do inconsciente.  A segunda razão pela qual se sonha explica-se pelo fato de que o sonho também é um instrumento Psicoterápico e pode ser um caminho para a resolução dos conflitos acima citados. É evidente que o fato de falar sobre os sonhos não nos libera diretamente dos problemas de ordem emocional, porém, se torna mais um recurso de tratamento para esses Transtornos Psíquicos.
            Os sonhos são formados por três categorias: a primeira são as impressões sensoriais noturnas que estão relacionadas às áreas sensoriais do corpo, como a audição, o tato e o olfato. A capacidade de ouvir os sons noturnos ou sentir algo sobre a pele pode levar à elaboração de um sonho específico referente ao que se percebe durante a noite. A sensação de frio durante um período noturno pode resultar na formação de sonhos referentes à ambientes hostis e até mesmos gélidos. Essa categoria normalmente não é capaz de interferir no processo natural do sono ocasionando o despertar precoce.
            A segunda categoria é representada pelos conteúdos relacionados às atividades da vida diária como o trabalho, as relações sociais e familiares, às pequenas e grandes frustrações, ou seja, todas as situações ou objetos que nos causaram preocupação ou foram passíveis de atenção durante o dia. Essa categoria é vivenciada durante o sonho em contextos que envolvem sentimentos de angústia ou prazer, esperança ou medo, orgulho ou humilhação. O exemplo mais clássico dessa categoria é quando a pessoa vivencia uma situação humilhante ou estressante no trabalho durante o dia e ao dormir encontra-se fugindo desesperadamente de algum monstro ou animal feroz. Paralelamente sente que seus membros não lhe obedecem à fuga. Na realidade tal manifestação onírica pode apresentar inúmeras interpretações, mas a título de exemplo pode estar relacionada à necessidade do sonhador de “fugir” ou se evadir da situação causadora de tensão psíquica, no caso, a situação real de estresse no trabalho.
            A terceira e última categoria denomina-se pelos conteúdos infantis reprimidos. Esses conteúdos são caracterizados por vivências ou situações que ficaram marcadas na história de vida do indivíduo e que não conseguem atingir a consciência porque podem causar desequilíbrio ou excitação mental insuportáveis, dando por conseqüência possíveis sofrimentos emocionais. A repressão desses conteúdos infantis é uma forma de defesa do eu com objetivo de preservação do estado psíquico.
            O sonho é inerente ao ser humano. Sonhamos todos os dias. Algumas pessoas afirmam não sonharem regularmente. O fato é que elas não conseguem se lembrar do conteúdo sonhado e isso dá a impressão de que não se sonhou naquela noite. Esse processo de esquecimento se dá pela razão de que utilizamos mecanismos de resistência aos conteúdos sonhados. A resistência, inicialmente, também é um mecanismo psicológico que objetiva preservar nossa estabilidade mente e corpo.  Quando essa defesa “falha” permitindo conteúdos ameaçadores ao aparelho psíquico denominamos de pesadelo ou tecnicamente de terror noturno. Os pesadelos são definidos por conteúdos do sonho capazes de desestabilizarem o psiquismo causando medo, pavor e despertar precoce.
            Por fim, sonhar é mágico e necessário. É preciso sonhar e não ter medo dos sonhos. Eles nos ajudam a entender um pouco mais o que somos e à que viemos.
            Sonhar faz parte da nossa existência e todo sonho, por mais sem sentido que seja aparentemente, tem sempre algo a nos contribuir porque sonhar é viver.



André Senna
Psicólogo
CRP- 14/01650-03
           

               

               
               

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